Autoria: Mario Quintana
“O Verão é um senhor
gordo, sentado na varanda,
Suando em bicas e
reclamando cerveja.
O Outono é um tio
solteirão que mora lá em cima no sótão
E a toda hora protesta
aos gritos:
“Que barulho é este na
escada?!”
O Inverno é um vovozinho
trêmulo, com a boina enterrada até os olhos,
a manta enrolada nos
queixos e sempre resmungando: “Eu não passo deste Agosto, eu não passo deste
Agosto…”
A Primavera, em
contrapartida
– é ela quem salva a
honra da família! – é uma menininha pulando corda,
Cabelos ao vento
pulando e cantando debaixo da chuva
Curtindo o frescor da
chuva que desce do céu
O cheiro de terra que
sobe do chão
O tapa do vento na
cara molhada! (…)”
Autoria: Mario Quintana
Deixa-me seguir para o
mar
Tenta esquecer-me... Ser
lembrado é como
evocar-se um
fantasma... Deixa-me ser
o que sou, o que
sempre fui, um rio que vai fluindo...
Em vão, em minhas
margens cantarão as horas,
Me recamarei de
estrelas como um manto real,
Me bordarei de nuvens
e de asas,
Às vezes virão em mim
as crianças banhar-se...
Um espelho não guarda
as coisas refletidas!
E o meu destino é
seguir... é seguir para o Mar, as imagens perdendo no caminho...
Deixa-me fluir,
passar, cantar...
toda a tristeza dos
rios é não poderem parar!
Autoria: Mario Quintana
Seiscentos e
Sessenta e Seis
A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…
Quando se vê, já é 6ª-feira…
Quando se vê, passaram 60 anos!
Agora, é tarde demais para ser reprovado…
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
Eu nem olhava o relógio
Seguia sempre em frente…
E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das
horas.
Autoria: Mario Quintana
Presença
É preciso que a saudade desenhe tuas
linhas perfeitas,
Teu perfil exato e que, apenas,
levemente, o vento
Das horas ponha um frêmito em teus
cabelos…
É preciso que a tua ausência trescale
Sutilmente, no ar, a trevo machucado,
As folhas de alecrim desde há muito
guardadas
Não se sabe por quem nalgum móvel
antigo…
Mas é preciso, também, que seja como
abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no
ar.
É preciso a saudade para eu sentir
Como sinto – em mim – a presença
misteriosa da vida…
Mas quando surges és tão outra e
múltipla e imprevista
Que nunca te pareces com o teu
retrato…
E eu tenho de fechar meus olhos para
ver-te.
Autoria: Mario Quintana
Bilhete
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
Enfim,
Tem de ser bem devagarinho, Amada,
Que a vida é breve, e o amor mais
breve ainda...
Autoria: Vinicius de
Morais A Rosa de
Hiroshima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida.
A rosa com cirrose
A antirrosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.
Autoria: Vinicius de
Morais Soneto de Fidelidade
De tudo ao meu amor
serei atento
Antes, e com tal zelo,
e sempre, e tanto
Que mesmo em face do
maior encanto
Dele se encante mais
meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada
vão momento
E em seu louvor hei de
espalhar meu canto
E rir meu riso e
derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu
contentamento
E assim, quando mais
tarde me procure
Quem sabe a morte,
angústia de quem vive
Quem sabe a solidão,
fim de quem ama
Eu possa me dizer do
amor (que tive):
Que não seja imortal,
posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto
dure.
Autoria: Vinicius de Morais
Pela luz dos olhos
teus
Quando a luz dos olhos
meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar
Ai que bom que isso é
meu Deus
Que frio que me dá o
encontro desse olhar
Mas se a luz dos olhos
teus
Resiste aos olhos meus
só p’ra me provocar
Meu amor, juro por
Deus me sinto incendiar
Meu amor, juro por
Deus
Que a luz dos olhos
meus já não pode esperar
Quero a luz dos olhos
meus
Na luz dos olhos teus
sem mais lará-lará
Pela luz dos olhos
teus
Eu acho meu amor que
só se pode achar
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