Chico
chegou da rua com um gatinho muito preto e muito magro debaixo do braço.
– Vai me dizer que já
arrumou mais dor de cabeça pra mim – disse-lhe a mãe.
– Olha pra ele, mãe,
tão bonitinho, tão magrinho. Ocê não tem dó dele?
– Dó eu tenho, mas não
quero saber de mais bicho em casa. O quintal já tá parecendo zoológico.
– A senhora mesmo vive
rezando pra São Francisco, o santo que acolhia os bichos…
– Não é por ser devota
de São Francisco que vou transformar minha casa em zoológico. Pode dar fim
neste gato, não quero mais saber. Chegam muito os três que vivem embaraçando
nas pernas da gente.
– Olha pra ele, mãe.
Só ele, tenha piedade do coitado. Não deve ter dono, nem pai, nem mãe, nem
irmãozinho.
– Não quero nem olhar.
– Já sei por que não
quer: para não pegar amor por ele. Alisa só o pelinho dele, vê como o coitado
tá maltratado. Se fosse um angorá, aposto que você ia querer.
– Se fosse um angorá,
o dono não deixaria solto na rua.
Chico saiu alisando o
pelo do gatinho, triste por ter que se livrar dele. Sentou no alpendre e
conversou com o gatinho:
– Você tem que compreender que a casa não é minha, se fosse…No fundo, ela tem razão. Tenho três cachorros, três gatos, um papagaio, meia dúzia de galinhas, uma já ninhada de cinco pintinhos; um casal de patos, um porquinho da Índia, um coelhinho orelhudo … Sem contar, lá no sítio, o bezerro, o potrinho e a promessa que meu pai fez de me comprar cabritos, bodes e cabras. Já vi que ocê não compreende, que quer mesmo ficar. Vamos lá dentro tentar de novo? Vamos?
– Mãe, você…
– Outra vez com esse
gato?
– Eu só queria um
pedaço de pão molhado no leite para dar pra ele. Depois de matar a fome, ele
vai embora. Vou jogar o gatinho bem longe daqui de casa.
A mãe deu um pedaço de
pão e um pires com leite. Chico começou a matar a fome do novo amigo.
Pão comido, leite
lambido, a mãe falou:
– Agora que ele comeu,
pode dar o fora. E trate de levar esse gato pra bem longe.
(...)
- Mãe, já arrumei um
nome pra ele. Quer saber qual é?
- Não quero saber
nada, quero que suma com ele.
- Pus o nome nele de
Faquir. Coitado, tão magro, faminto, sem família, infeliz. Mãe? Ocê ouviu o
nome dele?
- Ouvi. Tá bem
escolhido, mas pode levar o seu Faquir daqui logo, logo.
- Mãe, vamos fazer um
negócio?
- Que negócio?
- Meu aniversário está
perto. Ocê lembra o que foi que pedi de aniversário?
- Pediu pro seu pai
comprar um cavalo. E daí?
- Eu troco o cavalo
pelo Faquir. Ocê topa? Ele é tão infeliz, tão magrinho, sem ninguém por ele. O
cavalo fica pro ano que vem. Feito, hem, mãe?
A mãe não aguentou,
olhou com muito amor para o menino, passou a mão nos cabelos dele e disse-lhe:
- Pode, Chico. Mas que
seja o último bicho que você traz pra casa. Tá certo assim?
- Tá, tá certo, mãe. Ocê
é joia mesmo!
E bem baixinho no
ouvido de Faquir, disse-lhe:
- Eu não falei que ela
acabava cedendo? Ela é joia!
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